Henrique Carreiro em 2021-9-14
A linha de telefones Pixel da Google é um dos mais interessantes paradoxos da área atual da mobilidade. A Google tem, com o Android, a quota de mercado maioritária nos sistemas operativos para smartphone, mas os seus próprios dispositivos Pixel passam praticamente despercebidos, a não ser entre os utilizadores mais dedicados
E no entanto, os Pixel seriam supostos ser os bastiões da inovação no mundo Android. Com o Pixel 6, prestes a ser lançado, a Google espera retomar algum deste espaço copiando uma página da estratégia da Apple e acrescentando os seus próprios pozinhos mágicos. E que página é essa? É usar processadores desenvolvidos em casa, ao invés de comprados no mercado, como acontece com os fabricantes mais generalistas. É certo que a Samsung e a Huawei, por exemplo, já o fazem. Mas a Google desta vez decidiu usar os seus significativos recursos em Inteligência Artificial para criar um conjunto de circuitos integrados que promete um novo patamar de capacidade nas áreas do processamento de voz, imagem e segurança. Introduz, paradoxalmente, um novo fator na equação sempre em plena mudança entre o que é feito no dispositivo local e o que é feito na cloud. A menos dos dados transmitidos e da latência (que não são aspetos secundários a ter em conta) tudo ou quase o que os novos processadores permitem poderá ser feito na cloud. Mas o debate da privacidade da cloud é cada vez mais polarizado e ao disponibilizar estas capacidades no dispositivo, a Google está efetivamente a evitá-lo, a criar um caminho para o futuro semelhante ao que a Apple também está a fazer, ao assegurar que pode detetar padrões de utilização no dispositivo, antes mesmo dos dados serem carregados para a cloud. Naturalmente que a Google pretende ter maior controlo da experiência que entrega ao utilizador como a Apple já o faz. Já agora, também a Amazon o faz, numa perspectiva diferente, uma vez que desenha também os seus circuitos de datacenter. Temos, portanto, a génese de uma situação interessante, uma mudança das regras de jogo. Empresas que nos habituamos a associar a software estão cada vez mais a virar-se para a criação dos seus próprios circuitos integrados. Imitando, dir-se-ia, não apenas o modelo da Apple, mas sobretudo o da IBM, antes desta. Nada se cria, diria Lavoisier, e pleno de razão. |