Margarida Bento em 2020-5-12

BIZ

Análise

IT em tempos de COVID-19: os heróis invisíveis da pandemia

Por detrás da continuidade dos negócios e serviços críticos durante o Estado de Emergência está o trabalho, invisível, mas indispensável, dos departamentos e prestadores de serviços de IT, sem o qual as mudanças radicais do modo de funcionamento das organizações não teriam sido possíveis

IT em tempos de COVID-19: os heróis invisíveis da pandemia

Um país em confinamento: estabelecimentos não essenciais fechados, e todas as funções que não requerem intervenção presencial a serem desempenhadas remotamente. Empresas que anteriormente não contemplavam qualquer modelo de trabalho remoto passaram, de um dia para o outro, a ter perto de 90% dos colaboradores em casa. Numa questão de semanas, atividades como consultas médicas, aulas e compras de supermercado verificaram uma transição para o digital que, de outra forma, teria levado anos. O mais impressionante de tudo: salvo o ocasional e inevitável sobressalto – e mesmo tendo em conta os negócios que, infelizmente, não voltarão a reabrir – tudo isto foi feito, pelo menos no curto prazo, com sucesso.

Isto não aconteceu (apenas) porque as organizações portuguesas estavam mais preparadas para esta transição do que anteriormente previsto, mas sim devido ao trabalho do IT, tanto in-house como por parte dos prestadores de serviços, para garantir a continuidade de negócios nesta situação altamente disruptiva.

O papel da digitalização 

Por um lado, existe naturalmente uma grande diferença entre o impacto sentido em sistemas que suportam manutenção e operação remota e aqueles que requerem a presença física de profissionais de IT. A Claranet, por exemplo, relata não ter experienciado qualquer tipo de disfunção na operacionalidade da maioria dos seus serviços, visto favorecer fortemente modelos Cloud e aaS. Por outro lado, explica António Miguel Ferreira, Managing Director da Claranet, “todos os serviços de IT que implicam o manuseamento físico de infraestruturas (...), apesar de estarem também a serem prestados, têm algumas condicionantes, relacionadas com a menor disponibilidade dos clientes para abrirem as suas instalações, o que provoca alguns atrasos”.

O mesmo é relatado pela Noesis, que não tendo sentido particular impacto sobre áreas como Quality Management, Enterprise Solutions ou de Data Analytics & AI, foi obrigada a reinventar a forma como colabora com os seus clientes no âmbito de serviços prestados on-premises, segundo explica o CTO Nelson Pereira. Assim, as empresas numa fase mais avançada de transformação digital conseguiram, na sua maioria, uma transição rápida e segura para esta nova realidade, enquanto aquelas que se mantiveram num modelo de IT tradicional e on-premises estão a enfrentar maiores desafios tanto na transição para o teletrabalho como na manutenção da infraestrutura, seja esta feita in-house ou por prestadores de serviços. 

Ricardo Lebre, Head of Technology da Everis Portugal, aponta ainda uma segunda divisão: as empresas mais conservadoras, que estão a avaliar o impacto na economia antes de tomarem decisões de futuro, e as mais bem preparadas, para as quais este momento serve como um acelerador do processo de transformação digital. São estas as empresas, conclui, que vão tomar partido da situação para desenvolver novos modelos de negócio, trabalho e comunicação para o futuro.

“Para as restantes é um bom momento para avaliarem e, eventualmente, adequarem a sua estratégia, de forma a simplificarem os seus modelos de continuidade de negócio”, conclui o responsável.

Telecomunicações 

Sendo que todas estas tendências são aplicáveis a qualquer organização, ganham relevância adicional na área das telecomunicações. Por um lado, os serviços de uma única operadora são vitais para a manutenção das atividades de uma enorme percentagem do país. Por outro, a necessidade de serviços de telecomunicações veio a crescer de forma inédita neste período, alterando completamente a dinâmica da gestão das redes.

“O elevado volume de população em casa e a consequente necessidade de utilização ativa dos serviços de telecomunicações impôs algumas mudanças do ponto de vista de gestão e supervisão das redes, nomeadamente a necessidade de rápida adaptação a uma nova realidade e sobretudo ao desafio que é ter milhões de portugueses a utilizar simultaneamente as redes de telecomunicações”, explica Luís Alveirinho, CTO da Altice Portugal – garantindo, contudo, que apesar da natureza inédita da situação, esta é uma área na qual a Altice está habituada a ser resiliente e na qual existe rápida capacidade de adaptação.

Prova disso é a manutenção da disponibilidade do serviço que se tem verificado durante este período – resultado, em parte, do investimento que a Altice tem vindo a fazer para levar fibra ótica a todo o território português.

Adicionalmente, o Global Operation Center (GOC) da Altice Portugal tem sido responsável por gerir a operação, manutenção e gestão da rede nacional de telecomunicações de forma a garantir a otimização da mesma, bem como para manter as comunicações funcionais 24 horas por dia com uma performance adequada.

“Em muitos casos, existiu até um reforço totalmente voluntário por parte da Altice Portugal para aumentar capacidade das suas redes, o que permitiu igualmente uma maior capacidade de resposta dos serviços críticos para o País durante este período”, acrescenta Luís Alveirinho.

O futuro do IT 

Por outro lado, esta súbita pressão sobre os recursos tecnológicos das empresas pode também trazer consigo uma nova perspetiva sobre o papel do IT nos seus processos, evidenciando a importância da digitalização, não só como uma mera ferramenta, mas como uma salvaguarda vital da continuidade de negócios.

“Uma feliz consequência desta infeliz situação é que o processo de transformação digital das empresas foi acelerado. Fizemos em duas a três semanas o que normalmente demoraria dois anos a ser feito”, relata António Miguel Ferreira (Claranet).

Do mesmo modo, Abel Aguiar, Executive Director Partner Channel & Small, Medium, Corporate Markets da Microsoft, prevê que se verificará uma mudança de visão do IT de algo que suporta o negócio para algo que é crítico para o seu funcionamento.

“Este pode ter sido o maior momento de aceleração da transformação digital, em que se quebraram muitos mitos e barreiras culturais e psicológicas, e não será possível a regressão para o ponto de partida”, garante.

O responsável prevê também uma explosão na adoção de modelos cloud first ou cloud by default nas organizações, independentemente da dimensão ou setor, bem como, possivelmente, de tecnologias de robotic process automation e Internet of Things, de forma a permitir às empresas reduzir a necessidade da intervenção dos seus funcionários no terreno.

Por último, prevê também um impacto na posição das empresas face aos planos de contingência e continuidade de negócio, em consequência da preparação inadequada que ficou evidente nos riscos e custos desnecessários experienciados por muitas empresas nos últimos tempos.

Ricardo Lebre (Everis) acrescenta ainda que a atual situação representa uma oportunidade para as empresas se diferenciarem dentro dos seus setores ao oferecerem serviços digitais.

“É através da oferta de experiências digitais otimizadas que as empresas podem aproveitar a situação atual como uma alavanca para captar novos clientes e fidelizar em novos canais digitais, que, do ponto de vista operacional, podem ser altamente otimizados”, garante.

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