Jorge Bento e Marta Quaresma Ferreira em 2024-11-11

ENTREVISTA

Tem A Palavra

“Procuramos ser um Parceiro de confiança no sentido de ser previsível. Para o negócio é um aspeto muito importante”

O IT Channel dá este mês a palavra a Rui Gouveia, Channel Sales Manager da Lenovo, que apresenta a sua visão para o Canal português, numa altura em que a tendência é de que a Inteligência Artificial (IA) integre cada vez mais os produtos disponibilizados

“Procuramos ser um Parceiro de confiança no sentido de ser previsível. Para o negócio é um aspeto muito importante”

Rui Gouveia, Channel Sales Manager da Lenovo

Como é que o ano de 2024 está a correr para a Lenovo Portugal?

Está a correr bem. O ano passado foi um ano difícil para o mercado, foi o ano de ajustes, de recuperação, embora nós até tenhamos crescido. Mas o mercado caiu e a expectativa era a de que este ano já fosse um ano de retoma, tanto do lado de PC, que nós chamamos de IDG, da parte de dispositivos, como da parte de servidores, que nós chamamos ISG, de infraestrutura. E, de facto, temos as melhores expectativas: o mercado está a crescer, segundo os últimos resultados da IDC, à volta de 10% no global de PC. Nós estamos a crescer a diferentes ritmos conforme a área de negócio, mas na área profissional estamos a crescer cerca de 20% e tal, embora os resultados ainda não sejam finais porque estamos apenas com resultados preliminares.

Estamos a crescer acima do mercado e estamos com o market share também interessante. Na Lenovo não somos obcecados por market share, mas é uma questão relevante. Porquê? Isto é um negócio, sobretudo da área de dispositivos, não tanto da área de infraestrutura, em que é importante ter escala. É um negócio em que é preciso ter muita rentabilidade para investir em tecnologia, muito desenvolvimento de produto, e nós, felizmente, temos essa escala que nos permite ter rentabilidade e investir em tecnologia. Por exemplo, há fabricantes que saíram do mercado recentemente, que não saíram porque têm falta de qualidade, mas saíram porque não tinham escala, e não tendo escala num negócio muito competitivo, como é o nosso na área dos PC, fica complicado. Felizmente, a Lenovo tem essa escala e daí o market share também ser importante: por um lado mostra que conseguimos investir em tecnologia; por outro lado conseguimos estar presentes com essa escala a nível mundial para servir o cliente; e também valida a nossa estratégia e as opções que nós tomamos e, no fundo, mostra que os clientes confiam em nós e que estamos a tomar as opções corretas.

Qual o vosso market share no mercado empresarial e, a seguir, no doméstico?

Geralmente os fabricantes usam os dados da IDC e aqui o nosso market share é à volta dos 30%, um pouco menos, 29%, na área dos PC a nível global.

Qual a radiografia que faz ao dia de hoje do mercado português? Qual o estado dos Parceiros?

A nível do mercado, vemos alguma recuperação e algum investimento, embora, por exemplo, a área do setor público ainda esteja a sofrer alguma coisa - teve alguns projetos grandes, mas não está ao nível dos outros anos; o mercado SMB está um bocadinho mais pujante, embora o sentimento que tenho, por falar com os Parceiros, é de pessimismo.

Mas os números mostram o contrário: mostram que o mercado está a crescer, sobretudo o mercado SMB. Mas o sentimento se calhar até parte de uma característica nossa, do nosso “fado”, sempre a queixarmo-nos do mercado. Olhando para a vertente dos números, é um mercado que está a recuperar bem e que adota bem as novas tecnologias. Comparando com outros países do sul da Europa, somos um país bastante mais educado tecnologicamente, que está atento à ascensão da tecnologia e da inteligência artificial.

No que diz respeito aos Parceiros, embora haja alguma consolidação, ainda que algumas empresas infelizmente não consigam sobreviver, o número de Parceiros não muda muito. Somos um mercado de muita microempresa e o número mantém-se mais ou menos estável. Também temos crescido em termos de Parceiros, embora aí o crescimento não seja tão acentuado. Há mais foco, e isso é uma tendência a nível mundial, na parte de serviços. Nesse sentido, a Lenovo também evoluiu. Hoje já não é tanto uma empresa tão focada e orientada a produto e está num caminho de transformação mais orientado a serviço. Para terem uma ideia, mais de 45% da nossa faturação já não é da parte dos PC, já é de serviço, de infraestrutura, de serviço de valor. Um serviço onde não competimos com os Parceiros, mas onde, de facto, conseguimos dar mais valor aos clientes. E os Parceiros também seguem esse caminho. É claro que não queremos ser uma consultora; temos produtos que dão resposta às necessidades dos clientes, mas estamos nesse caminho de conseguir dar mais valor e entregar soluções e não tanto produto. Eu acho que o caminho do Canal é um pouco por aí. É uma abordagem consultiva que leva, no fim do dia, à fidelização dos clientes e também à melhoria da rentabilidade, que é o que todos procuramos.

A explosão da IA generativa tem levado a uma preocupação, também no lado dos fabricantes, em entregarem produtos que implementem já este tipo de tecnologia. A Lenovo não é exceção. De acordo com dados divulgados pela Context, os computadores com inteligência artificial já representam 16% das vendas na Europa. Como é que têm procurado acompanhar esta tendência?

O nosso lema – Smarter Technology for All – significa tecnologia mais inteligente que já existe há alguns anos. Agora, com a capacidade de processamento que hoje existe, abrem-se outras possibilidades.

O que vemos no mercado é uma preocupação grande das empresas de não desperdiçarem a oportunidade desta tecnologia que, de facto, tem muito potencial. Li algures que a IA é como a eletricidade: depois de descoberta, não dá para voltar atrás. E nota-se essa corrida, tanto dos fabricantes e Parceiros, como dos clientes, porque ninguém quer ficar de fora desta tecnologia com tanto potencial. Já há muitos PC no mercado com inteligência artificial. Para o ano, a nível mundial, 50% dos PC vão ser com capacidade de inteligência artificial e estima-se que até ao final da década 100% sejam assim. Vai ser adotada quase sem nós querermos e vamos usar como usamos a internet, o 5G, as tecnologias que vieram para ficar. A Lenovo tem um grande investimento nesta área. Já lançámos cerca de 80 produtos preparados para inteligência artificial e há também um ecossistema de Parcerias que nós integramos e que são importantes, porque é uma área nova, nem todos os players têm as valências todas e é importante também, até para os Parceiros, fazerem Parcerias com outros Parceiros, fabricantes, ou até mesmo com os clientes de forma a complementarem as suas skills.

Na Lenovo olhamos muito para a tecnologia com o potencial que ela tem. Temos desde equipamentos, criação dos modelos de linguagem alargada, até à questão da utilização da inteligência artificial na parte dos dispositivos, nos PC e smartphones. Estamos em todas estas áreas e, com este ecossistema de Parceiros, estamos muito bem preparados para ajudar as empresas na adoção desta tecnologia. Os Parceiros que não pensem que é só para grandes players, para grandes fabricantes, para grandes Parceiros: temos exemplos em Portugal, numa empresa têxtil, que tem um PC robusto, uma linha de montagem, ligado a uma câmara que faz controlo de qualidade na produção. No fundo, é um exemplo prático de como não é preciso grandes investimentos em infraestrutura. Um dos fatores que leva à incerteza na adoção da tecnologia é o custo do investimento na infraestrutura, porque tem de haver um business case claro para que se invista na tecnologia, e as pessoas vão olhar com cautela para isso devido ao custo de infraestrutura e implementação elevado.

É uma tendência que vemos no mercado. Os CIO estão a olhar para a inteligência artificial, a par da segurança. É a área onde investimos mais atualmente, a par da segurança, da sustentabilidade e do as-a-Service.

De facto, esta tecnologia tem a potencial de ter um contributo grande para o negócio e, por isso, os CIO estão a olhar para isto muito atentamente. Vai haver investimento grande nesta área, há muitos números que atestam isso. Eu diria para os nossos Parceiros não se deixarem levar pelo hype da inteligência artificial, mas também não vendam “gato por lebre”, ou seja, não coloquem uma etiqueta de IA e digam que têm IA e cobram mais por isso. Façam Parcerias sólidas até que se especializem em verticais onde possam aprender também com os clientes, e até, eventualmente, dedicando alguma rentabilidade numa fase inicial para depois recuperar mais tarde, de forma a criar business case de sucesso para depois replicar noutros clientes. Tenham noção de que é uma tecnologia para todos. Não nos vai tornar a todos ricos, mas alguns podem, seguramente, aproveitar isso.

Quais as principais estratégias da Lenovo para fortalecer a relação com os Parceiros de Canal portugueses?

Nós somos uma empresa de Canal. Estamos em Portugal desde 2014 e penso que os resultados e a operação têm sido de sucesso graças aos Parceiros. Por um lado, procuramos dotar os Parceiros do portfólio muito completo e competitivo e penso que é notório na indústria que temos os portfólios mais competitivos e mais alargados, desde PC, workstations, monitores, salas de colaboração, smartphones, tablets e a parte da infraestrutura. Isso é fundamental e sem isso não se consegue nada. Por outro lado, o que nós procuramos fazer, e eu acho que essa é também uma característica importante da Lenovo e acho que também é reconhecido pelo mercado, é facilitar a realização de negócio connosco. É muito fácil fazer um negócio com a Lenovo, seja porque tem ferramentas simples, rápidas, que funcionam, seja porque tenho uma equipa de pessoas acessíveis. Procuramos ser um Parceiro de confiança no sentido de ser previsível. Pode não parecer uma coisa muito relevante, mas o ser previsível para o negócio é muito importante. Implica que um Parceiro saiba que pode contar com a Lenovo e com grande probabilidade de ganhar o negócio. Por um lado, o cliente fica fidelizado porque o produto é bom; e por outro lado, é constante, ou seja, tem produto no mercado, os preços são mais ou menos competitivos, não há grandes oscilações, não andamos num trimestre a tentar ganhar mercado e market share e a investir em preços loucos, e depois no trimestre a seguir aumentamos 20% dos preços. Essa facilidade e previsibilidade de fazer negócio é muito importante para quem trabalha o Canal.

No fundo, passa por dar aos Parceiros o portfólio e as ferramentas de que necessitam para serem autónomos e conseguirem ganhar o negócio e disponibilizar especialistas para que consigam endereçar e propor a melhor solução aos seus clientes, seja do nosso lado, Lenovo, seja do lado do distribuidor, que também tem um papel fundamental na nossa operação. Por outro lado, também é necessário sermos competitivos e termos Programas de Canal que sejam orientados para os Parceiros.

Mantemos o nosso Programa de Canal Lenovo 360 que premeia quem é Parceiro na área de data centers e na área de PC, de dispositivos, porque queremos que seja um Parceiro completo. É um Programa que já está desenhado para vários níveis de Parceiros, para quem começa pequeno e quer construir o seu caminho com a Lenovo; para os Parceiros já mais tradicionais, temos um volume de faturação maior e, obviamente, terão os seus incentivos também.

Sobre a área de data center, como é que está a correr em Portugal?

Temos o lado positivo e o negativo: o negativo é que não temos o share dos PC; o positivo é que temos muito espaço para crescer. Obviamente, há algum caminho a fazer. Temos oferta muito alargada, muito competitiva, e temos provas dadas, temos recordes de benchmark, somos o fornecedor principal dos tops supercomputadores a nível mundial e sentimos um bocadinho que o mercado não conhece muito as nossas soluções. O nosso caminho nesta fase passa muito por divulgar essa parte do portfólio, que não é tão fácil de mudar como os PC, ou seja, exige alguma especialização, e normalmente os Parceiros têm técnicos pré-vendas, técnicos certificados e formados em outras tecnologias. E, como tal, conhecer mais um fabricante com mais uma série de tecnologias demora o seu tempo, não é fácil, mas é um caminho que estamos a fazer. Estamos a apostar muito na área de data center e conhecimentos.

Também têm a área de micro data center que é, basicamente, o equipamento edge…

Aí até somos bastante diferenciadores porque temos um portfólio grande, tanto na parte dos PC, edge, como na parte de data center. Hoje, com a questão da inteligência artificial, é preciso processar os dados no terreno, em tempo real, e aproximar o data center onde estão os dados. Estes servidores de computação são servidores com muita capacidade, muita performance, num formato completamente adaptado a esses ambientes mais hostis do terreno. Temos soluções edge que, de facto, precisam de ser divulgadas. Leva o seu tempo, mas estamos a construir esse caminho.

Quais as previsões/expectativas da Lenovo para este mercado para os próximos tempos?

Vivemos tempos bastante entusiasmantes e, com esta questão da inteligência artificial, vai haver seguramente mudanças, tanto no mercado como na nossa própria vida no dia-a-dia: a adoção da inteligência artificial com o Copilot Plus; o fim da fase da renovação de computadores comprados na pandemia, um pouco à pressa; as garantias e os computadores que já não cumprem bem a função, ou porque está já na fase da renovação, ou tem o fim de suporte do Windows 10. Perspetiva-se que 2025 seja um ano muito bom em termos de dispositivo, nomeadamente de PC. Acho que o mercado vai reagir bem. Na parte da infraestrutura, nós tivemos muitas ofertas com esta questão de IA, e espera-se que haja um aumento deste mercado com a adoção de soluções.

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