Jorge Bento e Rui Damião em 2023-10-11
Este mês, Alexandre Ruas, Executive Director da Claranet Portugal, tem a palavra e explica como é que o mercado nacional está a olhar para a transformação digital e o que é que as organizações estão a fazer para evoluírem
Alexandre Ruas, Executive Director da Claranet Portugal
Como sentem a maturidade das empresas nacionais na questão da transformação digital? Nas últimas duas décadas retirámos grande aprendizagem relativamente aos programas de transformação digital. O frenesim inicial da era digital levou as pessoas a acreditar em abordagens tipo “big bang”. Ou seja, a transformação estava literalmente ligada à sua própria definição: provocar uma mudança significativa em algo ou alguém, resultando em uma nova forma, estado ou função. Surgiram empresas digitalmente nativas e impuseram um sentimento de pânico generalizado e que urgia transformar. Com o passar do tempo e toda a experiência acumulada, as empresas nacionais foram percebendo que a verdadeira sustentabilidade está em ter uma abordagem holística, contínua no tempo e na sua maioria evolutiva. Nem sempre é necessário disromper. Durante este século, e possivelmente os seguintes, a tecnologia irá manter-se no centro da atividade económica, social e política, e por essa razão, foi (é) fundamental ajustar a estratégia a esta nova realidade. A visão de longo prazo tornou-se fundamental, bem como a análise das diferentes variáveis, técnicas e não técnicas. Na Claranet o tema da maturidade digital é analisado a cada ciclo de forma a ajustar a nossa estratégia e repensar posicionamento. De forma a nos suportarmos, sempre que discutimos o assunto tendemos a utilizar dados estruturados e objetivos. De acordo com o “Digital Economy and Society Index” da Comissão Europeia, Portugal ocupa o 15º lugar do ranking de competitividade, abaixo da média dos países da EU. Portugal tem realizado um esforço, ao qual a Claranet se associa, para se manter competitivo e se afirmar como Hub Tecnológico para o panorama europeu, realizando vários investimentos em recursos materiais e humanos. Apostas na requalificação de currículos académicos, na infraestrutura e conectividade, em Data Centers e até no discurso externo, têm-nos ajudado na atração de investimento e na criação de postos de trabalho. É, agora, fundamental continuar o caminho, com um foco especial na criação de valor e marca, reforçando políticas salariais que nos permitam reter os talentos e atrair novos, um bem muito escasso e crítico para os desafios tecnológicos e digitais. Em poucas palavras, a tecnologia está e estará no centro da competitividade das empresas e nacional, desenvolvemos um caminho que nos deu experiência e maturidade, mas é fundamental continuar a investir com uma estratégia de criação de valor contínua. Quais são os motivos para que isso esteja a acontecer? Vou abordar a pergunta de um angulo ligeiramente diferente. Para continuarmos a crescer na maturidade e recuperarmos alguns lugares no ranking da europa, como país pequeno que somos, deveríamos ter capacidade de aumentar o nosso espírito colaborativo e cooperativo, mesmo compreendendo que empresas e instituições podem ter objetivos finais diferentes. Vivemos um mundo global em que alguns dos nossos vizinhos mais próximos, como Espanha, França ou Itália, têm economias cinco a dez vezes superiores à portuguesa, e como tal, multiplicam a capacidade de investir na modernização e digitalização. Ao mesmo tempo, Portugal, mesmo na tecnologia, está fortemente alavancado no mercado de serviços, que por si só não é mau, mas o posicionamento de competitividade por custos de mão de obra laboral não perspetiva um futuro promissor. Assim, é fundamental imprimir um esforço de melhoria continua da base salarial, reforçar colaboração, investir no desenvolvimento de produto e marca de forma a nos reposicionarmos na cadeia de valor. Ao mesmo tempo, manter a nossa capacidade de atrair investimentos nas áreas de serviços, que permite aumentar a nossa exposição, ganhar experiências variadas e criar emprego. O que considera serem as boas práticas na transformação digital, especialmente no que toca à implementação de plataformas de cloud nas empresas? Quando é que corre particularmente bem, seja do ponto de vista de relacionamento entre as partes envolvidas, quer do ponto de vista técnico? Algo que sentimos na Claranet é que deixámos de ter medo de falhar. Ao invés de penalizar passámos a incorporar como aprendizagem e, de forma a diminuir possíveis impactos negativos, a abordar os projetos com um processo menos complexo e mais limitado no tempo. Quando falhamos, falhamos rápido e com menos impacto, aprendemos e incorporamos essa aprendizagem de seguida. Usando uma “buzzword”, somos mais “agiles”. Na jornada para a Cloud era comum tomarmos decisões orientadas à tecnologia, que muitas vezes nos tornaram reféns. Hoje, as boas práticas dizem que é necessária uma abordagem holística e orientada ao negócio. Um dos exemplos simples em que os nossos clientes pedem recorrentemente ajuda da Claranet é na eficiência, quer financeira, quer operacional. Estima-se que as empresas “desperdicem” cerca de 20% dos recursos Cloud, o que se pode traduzir em gastos significativos. De igual forma, dizer que a tecnologia, per se, é pouco significativa é incorreto. Torna-se cada vez mais claro para a Claranet que para um programa de transformação ou evolução digital ter sucesso, é fundamental uma visão de negócio clara, tendo em conta processos, operação, ecossistema, recursos, cultura, e claro, tecnologia adotada. Por fim, salientar um passo por vezes esquecido, mas que é fundamental no atingimento de metas, de acordo com a experiência da Claranet. A “aculturação” da empresa à nova realidade. Ao longo dos mais de 25 anos de existência a Claranet percebeu que uma parte significativa do sucesso dos projetos está na pós-produção. Ou seja, após o projeto ser entregue com sucesso, é fundamental trabalhar nos processos e metodologias, redefinindo o “modus operandi” da organização. Para tal, é fundamental definir um conjunto de métricas de adoção, treinar toda a organização e acompanhá-la até que a cultura tenha assimilado os objetivos estratégicos definidos. Quais são os verticais de mercado que sentem que estão a registar um maior crescimento em Portugal? Vou responder em duas partes, porque considero importante separar a dinâmica mercado e Claranet. De acordo com grande parte dos estudos disponíveis o mercado IT cresce entre 4% a 6% em Portugal, com sectores como a saúde, indústria e financeiro, juntamente com o setor público, em destaque. A pandemia, o PRR, a disrupção de alguns modelos de negócio mais tradicionais e o fluxo normal de atualização tecnológica provocaram uma aceleração na necessidade de digitalização do sector público e na adoção de Cloud no sector privado, contribuindo para o crescimento referido e previsão referida. A segunda parte da resposta tem mais a ver com a visão interna da Claranet e com a nossa estratégia de crescimento por aquisição e crescimento orgânico. Com o aumento da exposição à internet e a exploração de vulnerabilidades por terceiros, bem como o crescimento exponencial do volume de dados e seu potencial, a Claranet decidiu inovar e fortalecer o portfólio para continuar a responder aos desafios dos clientes end-to-end. Assim, para lá do crescimento conseguido através das práticas de “Cloud & Infra”, “Workplace” e aplicacional “APPs”, e que acompanha o crescimento de mercado, reforçámos a tendência através de “Security” e “Data & AI” nos últimos dois anos. Em certa medida, as dinâmicas dos diferentes sectores e a tecnologia levaram-nos a querer compreender melhor os ecossistemas para aportar mais valor. Após um período experimental, adotámos uma abordagem de mercado verticalizada, sem perder o DNA tecnológico que nos caracteriza. Atualmente a nossa organização baseia-se em cinco verticais de negócio e dois mercados, “Enterprise” e “Business”, e é com este modelo matricial que pretendemos continuar a apoiar nossos clientes em suas jornadas. Isso refletiu- se num crescimento das receitas no sector das Utilities e Financial Services, sectores estes que fizeram parte do piloto de especialização por vertical e que nos deixam boas indicações da estratégia. O negócio da Claranet assenta num conjunto de competências organizadas por tecnologias, como cloud, cibersegurança e workplace, e está a fazer uma jornada para endereçar o mercado pela verticalização, como os serviços financeiros, setor público ou indústria, entre outros. Quais são os desafios internos inerentes a esta mudança na forma de endereçar soluções? A Claranet é uma empresa com cariz ou ADN tecnológico e, em Portugal, com um legado grande de revenda de soluções e produtos, acompanhado de serviços de IT. Dessa forma, fomos desenvolvendo parcerias e uma penetração de mercado que nos alavancou muito o nosso negócio e exposição ao mercado. Partindo desta base, juntamente com o alargamento do nosso portfólio, competências técnicas e vontade em rebalancear o mix de venda produto/serviço, percebemos que poderíamos ir mais longe na abordagem e ajuda que damos aos nossos clientes. Para tal necessitamos de ser mais consultivos. Em 2021 começámos de forma mais concreta a definir a nova visão e governo, com foco na proximidade e verticalização da Claranet. Surgiram então as Unidades de Negócio setoriais e dois mercados, que se traduzem em Healthcare & Public Sector, Financial Services & Insurance, Telecom, Media & Technology, Retail e Industry, Utilities & Transportations. Apesar da complexidade e riscos que uma transformação de governo e cultura organizacional sempre acarretam, a possibilidade de aumentar a efetividade no acompanhamento e relacionamento dos nossos clientes, falar a mesma língua, gerar sinergias de marketing e vendas, reforçando a utilização do nosso conhecimento tecnológico para definir soluções especializadas, juntamente com a ambição de continuar a inovar, leva-nos a acreditar que é a melhor abordagem. Assim, passamos a ter a figura de “Business Unit” vertical, onde residem os Account Managers, ao mesmo tempo que criámos as “Practices”, onde habitam Sales Specialists e Solution Architects. O sucesso está na articulação destas peças com as equipas técnicas e na adaptação de processos e sistemas. Isto requer uma estrutura colaborativa e focado no cliente. Durante este ano fiscal, em particular, iremos estar muito atentos às dinâmicas internas, em particular na manutenção das nossas características tecnológicas, que tanto nos diferenciam no mercado e no mix de vendas de produto e serviço. As áreas de competências tecnológicas e as áreas de competências de negócio normalmente não são protagonizadas pelas mesmas pessoas. Correto. Preparámos durante um ano, um ano e meio, esta mudança e a liderança das áreas. Tomamos também a decisão de não contratar nenhum elemento externo para liderar Business Units ou Practices, privilegiando o desenvolvimento interno e premiando quem tem suportado a jornada da Claranet. Dessas, e sendo concreto, apenas duas pessoas que lideravam as antigas Business Units tecnológicas estão a liderar as novas áreas de negócio. Os restantes líderes são pessoas que estavam maioritariamente ligadas à atividade comercial. Ao mesmo tempo repensámos a liderança das Practices, trazendo uma visão mais profunda e estratégica de tecnologia e solução. Assim, passamos a ter a figura de “Business Unit” vertical, onde residem os Account Managers, ao mesmo tempo que criámos as “Practices”, onde habitam Sales Specialists e Solution Architects. O sucesso está na articulação destas peças com as equipas técnicas e na adaptação de processos e sistemas. Isto requer uma estrutura colaborativa e focado no cliente. Durante este ano fiscal, em particular, iremos estar muito atentos às dinâmicas internas, em particular na manutenção das nossas características tecnológicas, que tanto nos diferenciam no mercado e no mix de vendas de produto e serviço. Para projetos novos, ainda se coloca a questão on-premises versus cloud? Têm notado maior confiança dos clientes para colocar na cloud sistemas com dados críticos para o negócio? Tenho dificuldade em dar essa resposta de forma objetiva. Fatores como regulação, requisitos do setor ou de negócio, risco percebido, escalabilidade, entre outros, são críticos na escolha da estratégia Cloud. A Claranet está totalmente ciente dos prós e contras das várias soluções e manteve desde sempre uma abordagem aberta e isenta. Ou seja, através de parcerias bem sustentadas com os “Hyperscales Public Cloud”, com os principais fabricantes de soluções “on-prem” e ao longo das mais de duas décadas de história temos evoluído os nossos 45 Data Centers espalhados pelo globo, dos quais 2 em Portugal. Dessa forma acreditamos ter sempre a oferta e conhecimento necessário para ajudar os nossos clientes, independentemente da solução. Com o aumento de complexidade dos ecossistemas tecnológicos e aplicacionais, muitas vezes a melhor solução reside numa abordagem multi e hybrid-cloud, assegurando assim o melhor dos vários mundos e um ambiente mais eficiente, resiliente e seguro. |