Rui Damião em 2019-8-12
O mercado tem vindo a crescer e, no último ano, registou um aumento na ordem dos dois dígitos. No entanto, o primeiro trimestre de 2019 viu esse crescimento diminuir. Atos, Comstor, Fujitsu, HPE, Lenovo e NetApp/Arrow discutiram este mês o panorama atual do mercado português de servidores, armazenamento e virtualização
O mercado de servidores tem vindo a crescer. Segundo a IDC, o quarto trimestre de 2018 registou um aumento de receitas de 12,6%, marcando “o quinto trimestre consecutivo onde o crescimento das receitas foi de dois dígitos”. De acordo com a mesma entidade, as receitas atingiram os 23,6 mil milhões de dólares no mesmo período. A Gartner fez uma análise mais otimista: o crescimento da receita no último trimestre do ano passado foi de 17,8%, onde as receitas chegaram aos 21,9 mil milhões de dólares. Por outro lado, as unidades vendidas não registaram um crescimento tão acentuado. A IDC estima que, no mesmo período, tenham sido vendidas 5% mais unidades do que o último trimestre de 2017 enquanto a Gartner acredita que esse crescimento seja de 8,5%. Luciano Zoccoli, Lenovo DCG Portugal Solution Architect, afirma que “é normal” que o valor do equipamento tenha vindo a aumentar. Isto acontece, explica, porque “o mercado está a pedir mais equipamentos de hiperconvergência que são, normalmente, bastante mais ricos e com mais funcionalidades”. Alexandra Mira Silva, Senior Solution Architect da HPE, é da mesma opinião. “As unidades que temos visto são cada vez mais musculadas e com maiores rácios de consolidação que se traduzem em melhores TCO”. “Independentemente dos projetos do nosso mercado, há uma tendência para as empresas pedirem equipamentos convergentes ou hiperconvergentes”, salienta João Lavrador, NetApp Systems Engineer da Arrow. Este tipo de equipamentos permite que a gestão seja mais simplificada e que haja uma maior flexibilidade de crescimento, tanto a nível de computação, como em termos de armazenamento. Crescimento a desacelerar?Os números do primeiro trimestre de 2019 mostram que o mercado continua a crescer, mas menos do que 2018. A Canalys estima que o crescimento do mercado foi de apenas 4,8% depois “de um brilhante 2018, onde a taxa de crescimento para todo o ano atingiu os 16,3%”. Nuno Leonardo, Data Center Business Development Manager da Fujitsu, confessa que a empresa ainda não sente este abrandamento. “Acreditamos que existe um pipeline muito interessante no mercado e, durante o ano, devemos entrar em contraciclo com os dados” da Canalys. Nuno Leonardo admite que é possível que o número de máquinas vendidas venha a diminuir, mas, “do ponto de vista da faturação, a tendência é para crescer”. Paulo Graça, Diretor de Canal da Atos Portugal, refere que o número de servidores hyperscale vendidos tem vindo a diminuir, mas que esse decréscimo "foi compensado no último trimestre de 2018 pelas compras de soluções por parte das médias empresas”. Segundo Paulo Graça, o que pode ter acontecido no primeiro trimestre deste ano é que “não se esteja a conseguir compensar esse declínio do hyperscale”. Também a Atos acredita que o mercado não vai abrandar. “Vamos ter as mesmas taxas de crescimento do ano passado, pelo que, neste momento, não concordamos com a análise”. Pedro Rosa, Pre-Sales Specialist – Datacenter da Comstor, acredita que podemos estar a falar de um menor número de máquinas, “mas cada vez mais as máquinas têm mais capacidade, o que significa que temos mais valor”. Por outro lado, diz, está a aparecer no mercado a hiperconvergência que poderá alterar o paradigma do mercado. Alterações da realidadeO crescimento do mercado não se faz exclusivamente por acréscimo, mas também por substituição. É importante perceber porque é que as substituições de máquinas ou serviços se fazem pelo crescente volume de dados e a necessidade de tratar mais dados em tempo real, ou o replatforming. Alexandra Mira Silva afirma que a HPE não nota que há uma grande substituição de sistemas operativos. “Ainda existe uma grande faixa de mercado muito tradicional. Temos observado o desenvolvimento desta tendência de desenvolvimento, de DevOps e de containers”. Aí, explica a Senior Solution Architect, as empresas olham para um novo paradigma que vai “ter influência no ROI de uma solução que é proposta”. Está, de facto, a existir uma mudança. No entanto, esta transformação está a acontecer mais lentamente em Portugal do que noutros mercados. “Há toda uma geração, todo um background de conhecimento que vem do IT que tem de se adaptar a estas filosofias de DevOps que não se fazem de um dia para o outro”, diz. João Lavrador relembra que o crescimento de dados é exponencial. “Os dados são cada vez mais dinâmicos, mais dispersos e mais diversificados. Há um foco muito grande das empresas no negócio. Focando na analítica, pode ser um fator que pode levar ao tech refresh da infraestrutura on-premise”. “A mudança deve-se às aplicações”, diz Pedro Rosa (Comstor). “Tendo em conta que estamos cada vez mais dependentes das aplicações, temos que dar as ferramentas necessárias para que estejam sempre disponíveis para os utilizadores”. É aqui que aparece a hiperconvergência para poder responder de forma mais eficaz aos pedidos efetuados. “Vamos mudar para virtualizar o nosso data center e não apenas o nosso servidor”, refere. Analisar os dados“Na área do pós-cloud, vemos o edge como o futuro”, diz Paulo Graça. O diretor de Canal da Atos relembra que o edge não vem substituir a cloud, mas sim complementar aquilo que são os serviços a partir da cloud. “Isto acontece devido à necessidade de processar os dados o mais próximo possível de onde eles são originados. 75% dos dados são gerados no edge e apenas 25% são gerados no data center”. Isto obriga, explica, a transportar grande parte dos dados para o data center para os trabalhar lá. “Se tivermos a capacidade de fazer algum processamento, mesmo que seja o pré-processamento, no edge, vai aliviar a rede”. “Os dados sempre cresceram”, relembra Nuno Leonardo. O representante da Fujitsu dá como exemplo os arquivos em papel: à medida que as empresas recolhiam dados, era necessário aumentar esses arquivos. “A diferença está no facto de os dados deixarem de ser apenas dados e passarem a ser também informação; é toda a analítica e os cruzamentos que conseguimos fazer em dados que muitas vezes já existiam”. Nuno Leonardo explica que a capacidade de processamento é cada vez maior por causa desta necessidade de analisar estes dados que já existem e outros que são recolhidos de variadas formas. Isto traduz-se, diz, em máquinas “mais musculadas”. “A transformação digital das empresas é um dos fatores que impulsiona claramente a revolução tecnológica”, afiança Luciano Zoccoli (Lenovo). Esta transformação impulsiona as pequenas e médias empresas a fazer qualquer coisa por causa da necessidade de gerar valor a partir dos dados que as organizações têm em sua posse ou que ainda estão a gerar. Impacto da cloud“O que notamos é que os clientes olham cada vez mais para a cloud como alternativa”, afirma o pre-sales specialist de data center da Comstor. “Como tal, é natural que isso tenha um impacto na venda dos próprios equipamentos”. Deste modo, e com a elevada procura de serviços cloud, o mercado tem registado menos vendas e esse deverá ser uma tendência a continuar, uma vez que “cada vez mais empresas aderem à cloud”. João Lavrador relembra que a cloud “é uma realidade que já existe há muito tempo”, mas há serviços que “se calhar não eram considerados como cloud”. Exemplo disso são os serviços de email. Para as startups, por exemplo, a cloud é o ponto de partida para a empresa. De acordo com o systems engineer, “há serviços que fazem sentido estar na cloud, como analítica e novas soluções”. O NetApp Systems Engineer acredita numa realidade de cloud híbrida, onde seja possível guardar os dados onde for mais conveniente. A HPE olha para o mercado como híbrido e não apenas um dos extremos. Alexandra Mira da Silva refere o complemento da cloud, “mas de uma perspetiva cautelosa: traz muitos benefícios, mas nem sempre é a solução mais adequada em termos financeiros”. A senior solution architect refere alguns casos de empresas que migraram perto de 80% para a cloud e, neste momento, estão a voltar. “O regressar é também penoso, mas descobrimos muitas situações onde a cloud não é a solução”. A solução pode passar por analisar os benefícios que a cloud tem e transpor para dentro de casa. No caso da HPE, há uma aposta “num modelo de negócio em que trazemos a cloud para casa dos clientes, trazer todos os benefícios em termos de flexibilidade e entrega de serviço, entre outros, mas com a segurança e o controlo dos dados”. Luciano Zoccoli concorda com o que foi mencionado: a cloud híbrida é fundamental no dia-a-dia do trabalho. Atualmente, quando as empresas vão a um cliente vender uma solução, os seus concorrentes não são apenas outros fabricantes, mas também a cloud. Alternativa ou complemento?“Há uns anos, a cloud era vista como a alternativa – ou era isto, ou era aquilo. Agora começa a ser o ‘também pode ser’, o complemento”, refere Nuno Leonardo. Um pouco por toda a Europa, e, ainda que em menos escala, também em Portugal, começam a surgir casos de empresas que querem fazer o sentido inverso: estão na cloud e querem passar para dentro de casa. Segundo o data center business development manager, sair da cloud traz dois desafios acrescidos: “a flexibilidade e dos benefícios que a cloud traz, que é um desafio para o IT manager tradicional. Este é o novo desafio que as organizações têm: qualquer pessoa pode utilizar a cloud, subscrever serviços e pode desenvolver sem ter que pedir ao IT”. Outro benefício que a cloud-on-premises trouxe foi o controlo financeiro. “Se tiver dentro de casa, posso controlar financeiramente o que vou usar. O que a cloud também trouxe foi umas linhas pequeninas no fundo da página”, refere Nuno Leonardo. Para a Atos, o futuro também é híbrido, mas é preciso relembrar que, para o cliente, só existe um ambiente “onde vai buscar informações aos dois lados”. Acrescendo a este desafio, existe também o facto de que alguns clientes não têm apenas um serviço de cloud pública, mas sim dois ou três, o que aumenta o desafio de que exista apenas um ambiente para o cliente, independentemente de onde está alojada a informação. ArmazenamentoJoão Lavrador, da Arrow, refere que os discos de alta capacidade vão continuar a existir. “Têm o seu espaço, embora se possa assistir a um decréscimo de utilização”. No entanto, o SSD está, neste momento, a conquistar cada vez mais mercado; cerca de 70% das propostas apresentadas aos clientes já contam com esta tecnologia. A senior solution architect da HPE relembra que, há uns anos, dizia-se que por esta altura já não iriam existir discos mecânicos. Contudo, estes discos continuam a ter o seu espaço no mercado, “sobretudo por uma questão de preço”. O SSD é a primeira escolha em Tier 1 pelo desempenho que trazem, mas os discos mecânicos ainda vão manter o seu espaço no mercado. “Concordo que os discos mecânicos vão continuar mais algum tempo, principalmente para a parte do arquivo”, indica Pedro Rosa, da Comstor. “Cada vez se nota mais que os clientes pedem soluções all-flash ou hiperconvergentes”. No entanto, refere, o futuro serão, “indiscutivelmente”, os discos NVMe. “Dentro dos discos HDD há duas categorias: alta capacidade, que tem vindo a evoluir de alguma maneira, ainda mexe; e SAS, que não tem vindo a evoluir há algum tempo”, explica Luciano Zoccoli. O representante da Lenovo afirma que há clientes que pedem discos SAS e que passa por explicar ao cliente de que a tecnologia serve perfeitamente, mas que está em verdadeiro declínio e que não vai evoluir. Os discos de alta capacidade, por outro lado, continuam a ter uma relação custo-benefício bastante positivo, o que permite ser uma alternativa a soluções flash. “Aquilo que não leva a uma adoção mais rápida é o fator custo”, afiança o representante da Atos. Contudo, há outros fatores interessantes: “um deles é o green IT; como não há nada mecânico, os SSD têm um consumo energético menor, cerca de 62% menor do que nos discos mecânicos. Quando multiplicamos isto por todos os discos utilizados, a poupança é bastante considerável”. Em termos de tendências de mercado, a Fujitsu tem tido uma abordagem diferente do mercado e mostra-se cautelosa. “Dizia-se há uns anos que a tape ia deixar de existir, mas continuamos a apostar que a tape vai continuar a existir; não só porque é fácil de transportar, como fora do leitor é impossível hackear”, refere Nuno Leonardo. VirtualizaçãoAs empresas estão a caminhar para que o IT se consiga focar naquilo que são as tarefas do negócio moderno e não nas tarefas de rotina. Assim, explica a representante da HPE, “a hiperconvergência traz uma simplicidade para dentro do data center que claramente contribui para todo o automatismo necessário; sendo soluções altamente integradas, a facilidade de gestão é muito elevada”. Com a mudança do modo de fazer negócios, é preciso entender a quem, dentro da empresa, se deve vender o serviço. João Lavrador especifica que “há mudança de paradigma quando vendemos uma solução hiperconvergente. A ferramenta pode ter ferramentas de orquestração que não vamos vender a um administrador de armazenamento; vamos vender ao C-level. Vai comprar o serviço e vai disponibilizar à sua equipa de desenvolvimento que não querem saber o que está por baixo”. Pedro Rosa refere que “o objetivo é ter um automatismo quase total do data center ou da virtualização do data center, mas é o maior desafio que temos, tanto a nível de fabricante, como Parceiros ou como cliente final”. O problema não passa por ter as ferramentas de automatização, mas “por ter as ferramentas de automatização para fazer a gestão de toda a infraestrutura; o grande desafio é o Parceiro e o cliente final terem a visibilidade e quererem ir por aí”. “O que muitos clientes pedem é ‘quero ter aquilo que a cloud me dá, mas no data center’”, afirma o representante da Atos, que acrescenta que o grande desafio é “pegar na infraestrutura que já existe, nas aplicações e serviços que têm e fazer a migração”. Nuno Leonardo, da Fujitsu, diz que “há uma coisa de que temos de partir do princípio: o utilizador final já consegue fazer isto”. Deste modo, o trabalho dos fabricantes e dos Parceiros não é explicar que vão ter menos recursos, mas sim “ajudar a dar a mesma experiência de utilização da cloud”. O solution architect da Lenovo DCG Portugal relembra que “já existem e já estão disponíveis para os clientes muitas ferramentas para automatizar o seu data center. O que têm de fazer é o tech refresh para tirar partido destas ferramentas. Acho que a questão não está tanto em criar um portal dentro da empresa, mas em voltar ao híbrido, fazer a orquestração entre o que está dentro e o que está fora” da empresa. Parceiros“Há um ecossistema interessante para o Canal que são os cloud providers de Tier 2 e Tier 3”, refere Alexandra Mira da Silva (HPE). “Os Parceiros estão a apostar – e muito bem – nas suas ofertas de cloud, mais controladas e com uma cara por trás desse serviço”. Para serem bem-sucedidos neste mercado, os Parceiros têm de atualizar as suas capacidades de forma continuada porque “é um mercado que se mantém altamente tecnológico e onde é necessário muito mais conhecimento e investimento”, refere Luciano Zoccoli. O representante da Lenovo diz que é, também, muito importante a relação entre o Parceiro e o fabricante porque “quem tem mais sucesso nos clientes são os Parceiros mais dedicados porque têm as capacidades e o conhecimento, algo que o cliente final aprecia”. Nuno Leonardo acredita que há dois caminhos. “O Parceiro que vende tudo – o servidor, o posto de trabalho e, se for preciso, ainda passa os cabos – tende a desaparecer”. O trajeto é a especialização. Aí levanta-se outra questão: o Parceiro deve-se especializar numa determinada tecnologia, e andar lado a lado com o fabricante, ou especializar-se numa determinada área de negócio? A decisão cabe ao Parceiro, mas não há dúvida que o futuro passa pela especialização. É necessário investir. Paulo Graça explica que os Parceiros têm que ter capacidade de investir em conhecimento, em novas tecnologias, em novos modelos de negócio. A formação não é um custo, ainda que possa parecer a curto-prazo, mas sim um investimento para que o técnico responda melhor aos desafios que lhe são apresentados. “Muitas vezes, os Parceiros escondem os negócios dos fabricantes. Só falam do negócio quando é quase certo”, refere Paulo Graça. Este é um ponto menos favorável do ponto de vista do fabricante, uma vez que, sem transparência, a empresa não pode saber qual foi o Parceiro que, de facto, mais trabalhou para conseguir aquele negócio. “O maior desafio dos Parceiros é a evolução que a tecnologia está a ter”, diz Pedro Rosa (Comstor). Esta evolução faz com que os Parceiros tenham de se especializar, tal como já foi referido, e que permitam que os seus colaboradores tenham acesso às mais recentes tecnologias e informações que lhes sejam úteis para realizar o negócio. João Lavrador relembra que o “Parceiro é fundamental junto do cliente final” e que devem ser o “braço direito do cliente”. Os Parceiros têm que permitir ao cliente focar-se no negócio e ajudar na transformação digital. Um dos grandes desafios que atingem os Parceiros – e não só – é a falta de recursos qualificados. Começa a existir cada vez mais a necessidade de formações diferentes e a especialização necessária é cada vez mais difícil de adquirir no mercado. “O Canal é o nosso braço-armado”, refere Alexandra Mira da Silva. Os Parceiros são “a extensão da força de vendas” do fabricante e se não existir uma relação de confiança entre os dois lados dificilmente se poderão ajudar mutuamente. A representante da HPE sublinha que alguns dos casos de maior sucesso passam pelos Parceiros que têm um elevado grau de proatividade junto do cliente. Estes Parceiros trabalham as soluções e workloads e olham para as especificações requeridas pelos clientes. Mesmo em projetos que demoram dois ou três anos, estes Parceiros estão lá para ajudar o cliente final. |