Camila Vidal em 2019-10-01

A FUNDO

Especial

Mobilidade: chave da empresa moderna e desafio da cibersegurança

O Fórum dedicado à Mobilidade do IT Channel reuniu um painel onde os fabricantes foram a maioria, mas também se conheceram os testemunhos de distribuidores e integradores. Alcatel-Lucent Enterprise, Aruba/HPE, Decunify, Dynabook, Ingecom, Lenovo e Microsoft conversaram sobre os desafios do ambiente empresarial contemporâneo, onde a mobilidade é palavra-chave

Mobilidade: chave da empresa moderna e desafio da cibersegurança

A mobilidade, no contexto das tecnologias e sistemas de informação, deixou há muito de ser uma perspetiva, para passar a ser uma realidade obrigatória de endereçar. Fabricantes, integradores e distribuidores de soluções de mobilidade adaptaram-se, de formas diferentes, às realidades do Bring Your Own Device (BYOD), trabalho e colaboração remota, aplicações móveis, e ao empurrão que a cloud veio dar ao posto de trabalho contemporâneo, que cada vez se torna menos convencional e mais móvel, acompanhando o exponencial crescimento tecnológico.

Numa mesa redonda composta por representantes de fabricantes, integradores e distribuidores, a conversa entre os vários players do setor do IT convergiu em dois pontos principais: a adoção de soluções de mobilidade no ambiente empresarial português é heterogénea e a cibersegurança é uma preocupação real quando se adotam estas soluções.

A palavra "mobilidade" no vocabulário das empresas

Teresa Virgínia, Modern Workplace Business Group Lead da Microsoft Portugal, acredita que é “muito difícil falarmos do posto de trabalho moderno sem falarmos de mobilidade”, tratando-se de “uma tendência que só tem forma de acelerar”, sem espaço para regressar ao panorama anterior e convencional de um posto de trabalho fixo e pouco adequado às necessidades corporativas dos dias de hoje. A Microsoft entende a cloud como catalisadora das oportunidades neste contexto e Teresa Virgínia lembra que, em Portugal, a “cloud já representa mais de metade do negócio” da Microsoft.

Também os mercados verticais têm feito o seu caminho e não apenas no setor privado. João Passos de Almeida, Sales Specialist da Aruba/HPE, refere que “há muita inovação dentro do setor público, em diversos organismos, desde a justiça, à segurança social, administração interna e saúde”. O porta-voz da Aruba/HPE diz observar a diminuição de venda de pontos fixos de rede, a compra de “menos desktops e mais portáteis”, com “a idade dos utilizadores” a ser um fator essencial para o caminho que se traçou de desenvolvimento de soluções de mobilidade e BYOD. Por outro lado, a “maturidade” não é igual em todo o lado: “obviamente que temos grandes empresas que estão longe de pensar em mobilidade, e temos pequenas empresas que estão avançadas”.

Não se tratando de um cenário a preto e branco, é fácil perceber que a tendência – apesar de as variáveis que se observam, como o BYOD, cujo uso se verifica completamente heterogéneo e não ligado à dimensão da empresa – é que as empresas, quanto mais desenvolvidas, mais ferramentas de mobilidade oferecem aos seus colaboradores.

Miguel Coelho, Enterprise & Public Sector Manager da Lenovo Iberia, sublinha o papel do hardware nesta transformação: “os dispositivos são cada vez mais finos e leves”, cada vez mais redefinindo a palavra “portátil”. Não é menos importante “a questão do design, adaptado aos millennials”, assinala Miguel Coelho. “As empresas que não se adaptam ao estilo destas pessoas estão comprometidas” e não é possível a adoção de “soluções não movíveis nas empresas”, nem “um horário das nove às seis”, “rígido”, pode continuar a ser a norma, acredita a Lenovo.

Mobilidade é inimiga da segurança?

Paulo Silva, Business Development Manager da Ingecom, admite haver um lado negro na adoção massificada de soluções de mobilidade, “que é o facto de perdermos uma parte do nosso tempo pessoal” em detrimento da dualidade de utilização dos dispositivos móveis como apetrechos pessoais e profissionais. O BYOD é encarado como uma mais-valia para colaboradores e empresa no que toca à eficiência do trabalho, mas “no caso de um distribuidor muito vocacionado para soluções de cibersegurança”, a preocupação “não é a cloud, são os perigos que nos traz”. A Ingecom lembra que a segurança pode ser observada de “variadíssimas formas”, e “antigamente” tratava-se de “ver um laptop com um cabo a prendê-lo numa mesa”, mas hoje há outras preocupações prementes: “temos a segurança de informação que circula dentro dos nossos dispositivos móveis”; “deslocamo-nos a qualquer sítio e quando nos ligamos à cloud estamos a utilizar infraestrutura residente nesses sítios e onde os níveis de segurança não são os mesmos”. A solução está, então, em “adaptar os nossos equipamentos a esse tipo de ambientes”.

Bruno Santos, Diretor Comercial da Decunify, partilha a mesma preocupação. O “movimento massivo das pessoas para a adoção de cloud é um ponto assente e real”, mas “cada vez mais a disponibilização à rede da empresa é feita através de wireless e não com meios físicos, como antes”, e a Decunify diz não ver “as empresas preocupadas com a parte da segurança” que vem atrás destas alterações logísticas e organizacionais.

Luís Coelho, responsável por Pre-sales & Business Development na Alcatel-Lucent Enterprise, refere existirem “várias soluções a vários níveis”, “começando pelos próprios utilizadores”. “Ao nível da rede, há que entender o tráfego, e os switches e access points têm alguma capacidade de identificação e segmentação de tráfego”, mas é preciso mais trabalho. Impedir a entrada em segmentos de rede é o desafio, e Luís Coelho admite que “quando se chega à implementação” de soluções de segurança é mais difícil compreender holisticamente o que há a proteger, já que “existem muitos dispositivos disponíveis”.

João Passos de Almeida assinala o mesmo problema: “a decisão dos clientes de dizer: ‘eu tenho um prolema blema e quero endereçar esse problema’” não é algo natural e “há muita gente que pensa que segurança é só firewalls”. Por isso, “é necessário perceber o comportamento dos utilizadores depois de acederem à rede”. Muito contribuem para este passo “o machine learning e a inteligência artificial”, que “ajudam a defender as nossas redes, e as grandes empresas estão a olhar com muito cuidado para essas áreas”, ao mesmo tempo que “as implementações NAC cada vez são maiores”, embora se reconheça “a complexidade” da adoção de NAC (Network Access Control) num ambiente heterogéneo e por isso permeável a “más experiências”.

A Lenovo acredita que “a mobilidade é uma preocupação por dar mais azo à fuga de informação” e considera estar um passo à frente no que toca à “autenticação fingerprint, reconhecimento digital, ou etiquetas na webcam” – o último ponto já considerado obsoleto por Miguel Coelho, que lembra que “a segurança também é uma oportunidade de negócio”.

A Microsoft assume-se, neste contexto, também como “um player de segurança”, contando com “uma equipa de hackers interna que está sempre a testar a própria Microsoft”. Teresa Virgínia asserta a visão da Microsoft em como “a questão não é se as empresas vão ser atacadas, é quando vão ser atacadas”. E a ameaça pode não ser compreendida na sua verdadeira dimensão: “acreditamos que este nível de consciencialização ainda não está ao nível do perigo real que existe”, e a mensagem que a responsável deixa é de “alguma urgência para as empresas”.

Paulo Silva, por seu lado, acredita que “cada vez mais as pessoas estão mais cientes deste problema e percebem que se calhar isto não acontece só na ‘casa do vizinho’” e “a partir de momento em que existem dados, existe uma vontade quase ‘insana’ de os ir buscar”. O responsável da Ingecom lembra que o lado negro da explosão de dados e utilizadores é “cada vez mais não sabermos quem é quem”. O facto de “a maior parte dos utilizadores utilizarem como password ‘1234567’”, afirma Paulo Silva, não ajuda, certamente, à resolução do problema.

A digitalização da empresa: do controlo de acessos à escolha de hardware

João Passos de Almeida acredita que “para conhecermos o cliente temos de ter soluções de identidade” e revela que “os grupos de retalho estão a ter muita atenção a isso [controlo de acessos]”, embora reconheça grandes assimetrias no cuidado ao recolher e tratar dados e no cumprimento das normas do Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD). “Há diferentes estados de maturação, mas a tendência é: ‘eu preciso de saber isto, eu tenho de saber isto’”, menciona o responsável da Aruba/HPE, que volta a focar o setor público como exemplo e diz que esta “é uma preocupação dos decisores do nosso país”.

Bruno Santos partilha a sua visão relativamente à implementação de dispositivos de identidade e acesso, que considera ser “uma preocupação das empresas - em perceber quem é que acede e porquê -, mas só é implementado em empresas médias e em grandes”, sendo que as mais pequenas não terão recursos para aplicar, tratando-se de uma opção “restrita em termos de implementação” e que não acontece “massivamente”.

Do lado do BYOD, admite-se que a sua implementação no que aos PC diz respeito não se concretizou como esperado, mas vingaram os smartphones e tablets para este efeito. Teresa Vírigina, da Microsoft, refere que “quando olhamos para os first line workers, que não trabalham ao PC, mas estão num balcão, numa obra, numa localização a fazer o seu trabalho, precisam muitas vezes de comunicar com a empresa através do telemóvel”.

Sobre a separação entre o que é pessoal e profissional quando a ferramenta é só uma, essa é uma preocupação que as empresas procuram mencionar, e que não deixam de temer. A Ingecom foi a primeira a admitir o problema neste encontro, mas o responsável da Dynabook não deixou de o endereçar. Mário Pires, B2B Sales Account da empresa, fala da sua própria experiência para explicar a dimensão desta questão: “sempre fui um utilizador do Bring Your Own Device”, diz, mas no momento em que comprou “um telemóvel com dual sim”, de forma a poder integrar ferramentas de trabalho no seu dispositivo pessoal, “a empresa quis impor algumas limitações ao telemóvel”.

Assim, e sendo esta uma das principais tendências da mobilidade no contexto empresarial, a mesa não reuniu consenso sobre se um telemóvel pessoal deve passar disso mesmo. Teresa Virgínia mencionou a importância de um colaborador não se sentir “ameaçado no que é a sua esfera pessoal”.

E se “era normal ver-se as pessoas com dois telemóveis, o pessoal e o profissional, e a tendência normal foi que as pessoas utilizassem um só”, diz Bruno Santos, “o problema maior está quando, nas organizações, se diz ao utilizador que, se quer usar o seu device, vai ter de instalar aplicações de segurança, software específico”“quando isso acontece nem sempre o colaborador está disponível para isso, porque começa a achar que a empresa vai começar a controlá-lo através do software que colocou no seu telemóvel”. O Diretor Comercial da Decunify acredita que, por isto, “não é fácil” convencer os utilizadores a adotarem o BYOD.

A Alcatel-Lucent Enterprise considera que “os mecanismos que têm de adicionar na rede são de alguma forma mais complexos, e enquanto se mantiver um padrão, é mais fácil gerir o controlo dos dispositivos na entrada da rede, se forem até esse nível de controlo”, assinalando a comodidade que a não adoção do BYOD traz invariavelmente às empresas em termos de controlo e segurança.

A Lenovo está convencida de que “ao nível das grandes organizações não existe o BYOD”, mas no caso dos smartphones é diferente, ao mesmo tempo que o BYOD se inverte e se transforma rapidamente num “Bring Your Own Applications” (BYOA), em que são os colaboradores a levar as suas preferências aos dispositivos da empresa. Miguel Coelho refere que “ao nível das micro e pequenas empresas poderá haver mais essa tendência de BYOD” porque nesses espaços “os colaboradores não têm uma gestão de tecnologias de informação”.

João Passos de Almeida considera que “o BYOD, a nível de computação pessoal, teve penetração baixa” e isto pode dever-se ao facto de “as organizações também se transformarem, de disponibilizarem laptops e não desktops aos seus colaboradores”. De resto, o responsável acredita que “houve um grande hype” em relação ao trabalho remoto, mas também é necessária “a capacidade de percebermos quando é que devemos desligar o telemóvel”.

Teresa Virgínia acrescenta que 80% das pessoas utilizam, em trabalho, “aplicações que não são as da empresa” e “isso significa que não têm à sua disposição ferramentas que tornem o seu trabalho mais eficiente” e por isso procuram outras. Se “um millennial é posto a trabalhar num posto fixo, num desktop, onde só consegue ter acesso ao trabalho ali, e as aplicações que vai ver ali são de há dez anos, vai começar a ficar nervoso” e “não consegue fazer o trabalho de uma forma expedita”, “vai comunicar com os clientes de uma forma que não é profissional” e vai “utilizar o telemóvel com aplicações não seguras”.

É, então, preciso endereçar o BYOD - e o BYOA - como uma potencial ameaça para a segurança das empresas, mas também como uma potencial ameaça à privacidade dos utilizadores e colaboradores. Um cenário ideal de segurança ainda não é uma realidade nas empresas, que não estão todas ‘na mesma página’, mas os fabricantes, distribuidores e integradores têm e terão esta preocupação em mente.

Conectividade

As empresas não acreditam que os novos panoramas de conectividade – em que o Wi-Fi 6 e o 5G são protagonistas – venham a mudar profundamente as organizações e a forma de encarar o trabalho em mobilidade. Luís Coelho crê que “em termos das operações das empresas, haverá uma transformação das redes se optarem por adotar o Wi-Fi 6, porque toda a infraestrutura vai ter que ser alterada - aí sim vai levar a uma transformação, mas do ponto de vista da operação acaba por ser uma evolução natural, não há aqui uma disrupção, é compatível com as normas anteriores”.

“Acima de tudo”, Bruno Santos vê “uma expectativa grande dos utilizadores”: “vejo que há curiosidade, mas é uma evolução natural, não há aqui nada de transcendente”, mas lembra que há muito trabalho infraestrutural envolvido na adoção destas soluções e que “não basta mudar o ponto de acesso”.

A Ingecom vê a oportunidade de se criarem “estruturas mais rápidas, mais capazes”, mas ainda não se coloca a questão da ciberseguraança, embora Paulo Silva reconheça que “ao termos acessos mais rápidos, a tecnologia de segurança vai ter que acompanhar”. O representante lembra ainda que poderá haver assimetrias na aplicação do Wi-Fi 6 e 5G e que “existe país além de Porto e Lisboa”.

Para a Microsoft, “são sempre boas notícias”, pois “quanto mais capacidade, mais dados, mais velocidade”, mais espaço para “a inovação, novas utilizações que ainda não tínhamos pensado, fazer mais e melhor onde quer que seja”.

A Aruba/HPE deixa claro que as duas tecnologias serão complementares e “não se vão matar” uma à outra, mas João Passos de Almeida diz não ver “os operadores a fazerem uma oferta muito forte do 5G”. “Sinto que as pequenas e micro empresas vão entregar isso a um operador; não acredito que as grandes empresas deixem [a adoção] a cargo do operador”.

Tendências Futuras

Miguel Coelho considera que “o form factor” dos dispositivos móveis poderá ser o “touch”, e “o que vai vingar no futuro é o convertível”, sendo que “a voz também vai vingar” como comando, embora o teclado e a caneta não vão morrer, acredita. Sobre os dispositivos dobráveis, “estranho mas depois entranho”, refere o responsável da Lenovo. Por seu lado, Mário Pires, B2B Sales Account da Dynabook, prefere não fazer previsões e diz que “em relação aos ecrãs dobráveis não sabemos muito bem como se vão posicionar no mercado”, sendo que a aposta da Dynabook é no “laptop tradicional”. A importância dos comandos por voz também é reconhecida por Mário Pires e por Teresa Virgínia, que assegura que a prioridade da Microsoft é oferecer uma gama variada.

Oportunidades e papel dos Parceiros

A Lenovo entende que, na ligação aos Parceiros, o negócio da segurança será essencial, assinalando que no setor público “há muito a fazer”. A Aruba/HPE, com um negócio praticamente feito só através do Canal, diz não “marcar margens, não marcar negócio” e esperar a complementaridade dos Parceiros para o sucesso das suas vendas.

A Dynabook vende de forma “100% indireta” e quer “aproveitar o Wi-Fi 6 e o 5G”. A Alcatel-Lucent Enterprise, por seu lado, crê que o “Wi-Fi marketing” pode ser relevante para o desenvolvimento de planos de negócio e aposta em “quatro verticais principais”: “transportes, hotelaria, healthcare e educação”.

A Ingecom diz estar “a apostar no apoio ao Canal” e no “know how” dos seus Parceiros, enquanto a Microsoft diz que os seus Parceiros deverão endereçar as questões de segurança sobre as soluções da Microsoft, assinalando “uma oportunidade muito grande para desenvolverem soluções” próprias. Também o fim do suporte do Windows 7 significa “uma urgência” a que os Parceiros devem responder. A Decunify reitera que “os Parceiros ganham dinheiro é com os serviços acrescentados”.

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