2018-7-02
É nos dados que as organizações leem o seu futuro. As empresas mais bem-sucedidas são, e serão cada vez mais, aquelas que suportam as suas decisões no conhecimento gerado pelos dados
Entre o ponto de partida (dados) e o da chegada (conhecimento) estão as ferramentas de big data e analytics. Não é de hoje que as empresas se preocupam em relacionar-se com os dados, mas no passado estes eram mais escassos e mais difíceis de analisar, porque a tecnologia tinha limitações que hoje não existem. Nos últimos anos o volume de dados tem vindo a crescer de forma exponencial, que se explica pela digitalização gradual dos negócios e das pessoas. E já não são apenas os humanos a gerar dados. Os dispositivos de IoT continuam a proliferar, à medida que mais e mais sensores povoam o nosso mundo, trazendo para o digital informação oriunda do mundo físico. De acordo com o IDC FutureScape: Worldwide Analytics and Information Management 2018 Predictions, caminhamos para a era da monitorização de tudo, onde a qualidade e a relevância dos dados serão cada vez mais críticas para a sobrevivência das organizações. O relatório refere ainda que as decisões humanas serão cada vez mais assistidas por recomendações algorítmicas: o machine learning levará a uma mudança profunda na forma como dados e conteúdo são geridos e analisados, auxiliando ou até mesmo automatizando a tomada de decisão. Se recolher a informação não é um problema, geri-la, prepará-la e analisá-la pode sê-lo se as empresas não evoluírem as suas estratégias, processos e infraestrutura de IT. O big data e o analytics são a chave para a revelação de padrões escondidos em grandes volumes de dados, para os insights que têm o poder de transformar verdadeiramente os negócios através da identificação de novas oportunidades – decisões mais ágeis e fundamentadas, diminuição de custos e desenvolvimento de novos produtos e serviços são três grandes benefícios. Mas já lá vamos. Antes importa perceber como estão as nossas empresas a olhar para estas tecnologias. Os participantes desta mesa redonda traçaram um cenário onde figuram diferentes estádios de maturidade do ponto de vista da adoção destas ferramentas, mas concordaram num ponto essencial: as nossas empresas querem extrair valor dos seus dados. “Sabem que querem estar neste novo paradigma, mas não sabem o que têm de fazer para o conseguir”, indicou Nuno Maximiano, business analytics sales leader na IBM. Por norma, referiu Pedro Nunes, big data lead na BI4All, os setores onde existe maior competitividade estão mais avançados. “Retalho, logística e telecomunicações são setores que têm necessariamente de ter capacidade de adaptação para conseguirem manter-se no mercado”. De uma forma geral, há empresas que estão ainda numa fase inicial, “a tentar explorar as melhores formas de aproveitar as vantagens destas soluções”, disse, e algumas estão a montar os seus primeiros data lakes. A Xpand IT, por sua vez, tem tido projetos desta natureza na área da saúde, utilities e transportes. Nuno Barreto, partner & big data lead, apontou o setor que não está tão avançado: a banca. “Só mais recentemente tem havido alguma vontade por parte da banca de retalho”. O SAS, que tem clientes maioritariamente na área da banca, a par do dos seguros, atribui o atraso à pressão regulatória. “Já existem, porém, iniciativas no sentido de prestar um serviço diferente. Porque o que faz realmente a diferença já não é o produto, onde existe cada vez menos diferenciação. O que faz a diferença é o serviço, a experiência do cliente”, destacou Sofia Esteves, head of professional services. Nas PME, os últimos dois anos têm sido pautados por um interesse crescente e cada vez mais acentuado por esta temática. “Trabalho com PMEs há muitos anos e é muito curioso observar o interesse que hoje existe”, salientou Isabel Eufrásio, partner & technology evangelist na HighValue. “Algumas têm mesmo a intenção de implementar estas soluções, o que se explica pela nova geração de empresários, que procuram ir mais além”. Os líderes das pequenas e médias empresas querem apostar em tecnologia, e nestas tecnologias, “para aumentar a produtividade e marcar a diferença”. Isabel Eufrásio identifica “uma evolução tremenda na forma como olham para a tecnologia e como a valorizam”. A indústria, e “tudo o que se relacione com a prestação de serviços na indústria”, indicou, é um setor que se destaca particularmente no que diz respeito à procura de soluções de big data e de social media. “No analytics, a procura é transversal a todos os setores”. Área onde faltam pessoas O setor das TI tem como principal desafio a falta de profissionais. Quando chegamos ao big data e analytics, a escassez é ainda mais acentuada. “Uma das dificuldades que vejo em Portugal, mas também na Europa, é a falta de pessoas qualificadas nestas áreas. Isto é um problema porque sem estas pessoas, sem data scientists, as empresas não conseguem explorar estas áreas”, sublinhou Pedro Nunes (BI4All). Para Nuno Barreto, este é um tema que “vai levar muito tempo a resolver”, até porque, lembrou, existem áreas, nas TI, em que a falta de profissionais é “um problema crónico”. Para as empresas que se dedicam a prestar serviços nesta área, lembrou, é uma boa oportunidade para desenvolver propostas de valor acrescentado. Se a necessidade de recursos especializados tem tendência para nunca ser totalmente suprimida, resta às organizações um caminho, no entender de Nuno Maximiano (IBM). “Vão transformar-se por forma a consumir micro serviços de entidades externas. Com o big data e analytics, a tendência é para que as empresas detenham os seus ativos críticos e que tudo o que não o é seja externalizado. Acredito que haverá uma transformação nesse sentido, e será uma forma de colmatar a necessidade de recursos”. Pedro Nunes (BI4All) também o realçou: “Há empresas a utilizar micro serviços, colocando uma pergunta e obtendo uma resposta com dados treinados pela própria empresa”. Na Europa, a falta de data scientists também é uma realidade, o que está a levar as empresas a investir em automated machine learning. “Permite que os utilizadores de negócio, através de um conjunto de ferramentas, realizem eles próprios uma análise dos dados. Não resolverá todos os problemas, mas resolverá uma parte. E já existem ferramentas que o permitem”. Do mesmo modo que o self-service das ferramentas de BI e analítica não são hoje o mesmo de há uns anos, também o machine learning está a evoluir para o que diz ser “uma espécie de self-service machine learning”, de modo a que não se dependa tanto dos data scientists. A verdade é que a automatização que advém da evolução tecnológica poderá de algum modo levar a que “as tarefas rotineiras possam de algum modo ser substituídas”, disse Sofia Esteves (SAS), que também não deixou de enfatizar a importância de haver uma “democratização do acesso às ferramentas de analítica”, para que mais utilizadores de negócio consigam extrair valor dos dados. “O SAS, a este respeito, tem apostado em ferramentas visuais de estatística”. Assim, defendeu, o maior desafio é “encarar os dados como um ativo e geri-los da melhor forma, o que ainda não acontece”. Para Nuno Maximiano (IBM), a comunidade open source, os integradores e os fabricantes de software têm de simplificar ainda mais o acesso a estas tecnologias, até porque “existe uma forte apetência por algo preditivo”. Um tema de sobrevivência, e não apenas de competitividade Não haverá expressão mais escutada do que “os dados são o novo petróleo”, analogia que transmite o quão vitais são para a sobrevivência das organizações. “Quem não entender estes temas como prioritários será provavelmente engolido por quem está a apostar neles”, alertou Nuno Barreto (Xpand IT), dizendo que este não é somente um tema de competitividade.
No domínio dos conceitos, a Oracle opta pelo da liquidez. “No fundo é olhar para os dados como o capital da empresa”, explicou Jorge Loupa. Trata-se de compreender o esforço que é necessário empreender para transformar os dados estruturados (oriundos de fontes mais tradicionais) ou não estruturados (de fontes mais emergentes, como a Internet of Things ou as redes sociais) em conhecimento. E por onde devem as empresas começar na sua jornada de gestão e exploração da informação? “As empresas têm de perceber antes de mais qual o use case que querem resolver”, indicou Pedro Nunes (BI4All). Porque podem não precisar de uma solução de big data, mas somente de analítica, por exemplo. Importa, portanto, identificar as soluções que darão maior retorno ao negócio, tendo em conta as especificidades deste. “Muitas vezes investe-se muito tempo e dinheiro em projetos, sem definir bem o objetivo e sem solucionar o principal problema da empresa”, alertou. Cada empresa terá uma necessidade específica, mas existem preocupações comuns. A principal é ser relevante para o cliente. “Querem destacar-se, conhecê- -lo e propor o que faz sentido para cada pessoa, tendo em vista uma personalização crescente”, realçou Sofia Esteves. Passámos da fase do “one size fits all” para a da segmentação, acrescentou a responsável do SAS, e estamos agora na fase de olhar para cada cliente de modo individual, um imperativo de negócio que é também um tremendo desafio. “As empresas maiores, mais tradicionais e com processos pesados necessitam de agilidade para reagir aos níveis de customização que os clientes exigem”. Isso leva a que tenham de criar centros de analítica avançada que não abranjam somente o marketing mas “toda a cadeia de valor da empresa”, sublinhou, tendo em vista, por exemplo, o desenvolvimento de novos produtos, a redução do risco e até mesmo o combate à fraude. “Existe um grande interesse pela utilização do analytics numa perspetiva mais preditiva, para estar um passo à frente”, reforçou. Para uma seguradora automóvel, por exemplo, pode ser a oportunidade de adaptar um plano de seguro ao estilo de condução de cada pessoa, uma possibilidade que ganha mais força à medida que os automóveis se tornam verdadeiros dispositivos de IoT, conetados e povoados por sensores de todo o género. A manutenção preditiva é outro dos use cases que aliam a IoT ao big data e analytics, e que permite “prever a forma como a produção pode ser afetada”, lembrou Nuno Maximiano (IBM), detetando anomalias antes destas ocorrerem. Jorge Loupa (Oracle) não esqueceu a tão importante visão 360 do cliente. Em empresas com um modelo de negócio B2C, esta capacidade “pode fazer a diferença entre o sucesso e o insucesso”, sublinhou Pedro Nunes (BI4All). No contexto da indústria 4.0, Nuno Barreto (Xpand IT) lembrou que estas ferramentas permitem “atuar sobre os dados oriundos dos sensores a uma velocidade que outrora não era possível”. Neste setor, onde a HighValue desenvolve bastantes projetos, e que depende fortemente das exportações, “essa informação é vital para marcar a diferença”, apontou Isabel Eufrásio. Neste ponto é possível capitalizar investimento para “diminuir ineficiências”. Até porque, insistiu, “ainda existe muita ineficiência pela incapacidade de olhar para a informação”. Para as PME, já não chega somente olhar para trás. “A informação que se retira dos relatórios muitas vezes não está estruturada, o que significa que não é possível antever o futuro. E estas empresas querem ver projeções, comportamentos e tendências, de forma intuitiva. Isto fará muita diferença nas nossas PMEs, em termos de capacidade de competitividade, tanto no nosso mercado como noutros”. Uma decisão da gestão O sucesso de qualquer projeto de transformação digital depende não das tecnologias, mas das pessoas. No caso do big data e da analítica, as dificuldades não dizem somente respeito à falta de data scientists. “É verdade que há uma nova geração de gestores, mas continuamos a ter líderes de PMEs e de grandes empresas que ainda desconfiam destas tecnologias e que acabam por levar as empresas para cenários menos interessantes”, apontou Nuno Barreto (Xpand IT), que entende que o outsourcing que as empresas têm feito do seu IT demonstra “como a gestão das empresas não viu a analítica como algo altamente estratégico”. Porque, acrescentou, quem fez estes processos de forma massiva tem no seu IT interno pessoas que “percebem de gestão de nível de serviço e muito pouco de IT”. Trazer essa capacidade para dentro de casa “levará algum tempo”. O IT interno das empresas ainda é, em muitos casos, “fator de não inovação”. Para Jorge Loupa (Oracle), a criação de centros de competência nestas áreas é muito importante para “normalizar o processo de adoção da tecnologia”, porque está em causa “criar uma cultura de inovação em que falhar seja fácil e barato, permitindo que algumas ideias possam ser exploradas”. Para as empresas serem data-driven, IT e negócio têm de andar de mãos dadas, com o negócio ao comando deste tipo de iniciativas. A BI4All tem-se deparado com dois cenários: “Algumas empresas separam claramente o negócio do IT e colocam do lado do primeiro as iniciativas que o IT deverá suportar. Existem outras em que o IT sente a necessidade de ser ele próprio a definir os passos, quando claramente deveria ser o negócio a fazê-lo”, comentou Pedro Nunes. Como resumiu Sofia Esteves (SAS), tudo o que implica uma grande mudança na organização “necessita de um sponsorship por parte da gestão”. Nas PME também é assim. “Por norma são os empresários que procuram estas soluções. E quando assim é a probabilidade de sucesso é muito superior. Até porque estes empresários não estão a ir atrás das modas. Eles sabem que se não se alinharem com estas tendências o negócio pode ficar em causa”. Dados têm de ser de confiança Outro entrave importante é a falta de políticas de gestão de dados, entendidas como um desperdício de recursos e de dinheiro, mas que são absolutamente críticas para que as empresas lidem com dados de confiança. Além do mais, o big data aporta mais complexidade a toda esta componente, como notou Sofia Esteves (SAS). “A gestão da informação, na perspetiva de ter ou não qualidade, é um fator bastante importante. Mas é uma tarefa morosa e dispendiosa”. Porém, se a informação que se vai analisar não é de qualidade, não é possível extrair valor a partir dos dados. “Isso pode fazer com que as empresas sintam mais receio em avançar para iniciativas deste género”. A boa notícia é que o Regulamento Geral de Proteção de Dados (RGPD) veio acelerar os investimentos na componente de gestão da informação, pela necessidade de terem “uma monitorização muito maior da informação”. Também a IBM tem notado, nos últimos seis meses, que as empresas estão a aproveitar o RGPD para canalizar verbas para o data management. “É um sinal muito positivo, porque mesmo as empresas mais avançadas em termos analíticos não tinham gestão de dados. O RGPD serviu para impulsionar o data governance”, observou Nuno Maximiano. Infraestrutura tem de ser híbrida Para suportar as iniciativas de big data e analytics, as empresas necessitam de infraestruturas ágeis e com a elasticidade necessária a uma adaptação constante ao volume crescente de dados. No entanto, não podem levar todos os seus dados para a cloud pública, muito menos os que forem críticos para o seu negócio e para a sua diferenciação. O IT híbrido é a melhor resposta. Jorge Loupa (Oracle) realçou que, apesar de a cloud pública poder trazer reservas, é imprescindível para uma utilização elástica e escalável destas soluções. Pedro Nunes (BI4All) também defendeu uma abordagem híbrida, “para dar flexibilidade ao negócio”. Para a IBM, o futuro “será claramente híbrido”, pelo mesmo motivo. “On-premises não é possível escalar e tudo o que não for crítico pode ficar fora de casa”. Segundo a Xpand IT, os clientes que fizeram investimentos em data centers próprios tendem a continuar a investir em infraestrutura. “Os que começaram de forma mais controlada, sem tanto CAPEX, por norma optam pelo OPEX da cloud”. As PME, por sua vez, olham para a cloud como a oportunidade de fazer “pequenos deployments”, já que nestas empresas “não há tempo nem dinheiro para aguardar por grandes implementações”, notou Isabel Eufrásio. As PME não têm tanta capacidade financeira para arriscar, é certo, mas também têm a vantagem, segundo Nuno Maximiano, de não terem tanta infraestrutura legacy, que nas grandes empresas “é e será sempre o desafio no momento de evoluir para sistemas flexíveis”. Nestas, há um momento em que tem de considerar-se “começar quase de novo”. O mais importante, on ou off premises, é, como frisou Sofia Esteves (SAS), a flexibilidade da infraestrutura. “Tem de estar preparada para uma análise de dados em tempo real”. Os Parceiros assumem, neste ponto, o importante papel de maestros das infraestruturas, já que estão na posição de ajudar as empresas a evoluir toda a componente infraestrutural, sem a qual não é possível abraçar uma estratégia alicerçada na análise de dados. “Por conhecerem a oferta dos fabricantes e a realidade dos clientes, e porque conseguem entregar as tais pequenas implementações, tendo em vista uma finalidade global, são absolutamente fundamentais”, avançou Nuno Maximiano (IBM). Além do mais, acrescentou, “orquestrar todos os componentes que estão a transformar a infraestrutura exige um profundo know-how, em nome de uma entrega rápida”. E uma vez que a realidade do IT é híbrida, são “críticos” para “integrar o que está dentro de casa com o que está fora, para que os dois mundos possam comunicar de uma forma transparente”. Também Jorge Loupa (Oracle) defendeu que os Parceiros são “muitíssimo relevantes neste processo”, porque conhecem as empresas como ninguém. “Os Parceiros aportam esta valiosa capacidade de customização e adaptação das soluções. Têm a capacidade de pegar nas peças relevantes e de erguer uma arquitetura que faça sentido e que acrescente valor”. |